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É difícil encontrar alguém que nunca tenha tido ao menos uma interação com algum dos aplicativos do grupo comandado por Mark Zuckerberg, como Facebook, Instagram e Whatsapp.
Enquanto seus aplicativos são praticamente unanimidade, o homem por trás desse império das redes sociais teve sua relativamente curta trajetória nos negócios envolta em polêmicas.
Quando Mark Zuckerberg começou a escrever os primeiros códigos do Facebook, ainda com 19 anos, no seu alojamento em Harvard, ele passou a redefinir o conceito de interação na internet — e também a colecionar desafetos.
Vindo de uma família de classe média, Zuckerberg sempre gostou de programação de computadores. Desde cedo, desenvolveu diversos aplicativos fechados para sua família e amigos ou abertos ao público, antes de começar o que pode ser chamado de sua obra-prima: o Facebook.
O potencial da rede social parecia tamanho que Zuckerberg abandonou sua formação em psicologia e ciência da computação, em Harvard, para transformar o Facebook em um negócio viável, na companhia de seus colegas de faculdade e cofundadores: Chris Hughes, Eduardo Saverin, Dustin Moskovitz e Andrew McCollum.
Além do projeto de sua vida, foi também em Harvard que conheceu Priscilla Chan, com quem se casou em 2012 e tem duas filhas. Chan é sua companheira na iniciativa de doar 99% da fortuna de US$ 77 bilhões para projetos sociais.
Família e formação
O bilionário criador do Facebook nasceu em uma família de classe média alta no subúrbio de Nova York, filho da psiquiatra Karen Zuckerberg e do dentista Edward Zuckerberg. Seus irmãos são Randi, Donna e Arielle.
Como a maioria dos jovens nascidos nos anos 1980 nos EUA, Mark Zuckerberg teve contato logo cedo com computadores. Na adolescência, já brincava de escrever códigos de programas.
O primeiro empurrão veio de seu pai, Edward, que o ensinou a linguagem BASIC utilizada nos consoles do Atari. Ao perceber o interesse de seu filho, contratou um professor particular de programação.
Os resultados da tutoria particular começaram a aparecer em pouco tempo. Aos 11 anos, Mark escreveu um programa para conectar os computadores da família e aquele utilizado por seu pai, que trabalhava de casa.
O objetivo era simples: poder falar com o pai entre as consultas e avisar quando o próximo paciente havia chegado, sem precisar correr pela casa. A solução foi batizada de ZuckNet e era uma rede com comunicador instantâneo que permitia a troca de mensagens entre as máquinas.
Depois do mensageiro, Zuckerberg criou um tocador de música que embutia uma das principais características do que seria o Facebook no futuro: a tentativa de prever o que o usuário quer consumir.
Desenvolvido em parceria com seu colega e o futuro diretor de tecnologia da rede social, Adam D’Angelo, o programa em sua aparência não era tão diferente dos diversos tocadores de MP3 da época, como o Winamp ou Windows Media Player.
Seu diferencial aparecia depois de uns dias de uso, quando o programa cruzava dados das músicas já ouvidas e passava a indicar as próximas músicas.
O uso de inteligência artificial para prever o futuro chamou a atenção de gigantes como a AOL e a Microsoft, que fizeram oferta para comprar por cerca de US$ 1 milhão o Synapse Media Player da dupla, com uma proposta de emprego para seguir desenvolvendo o programa.
Talvez por rebeldia, eles recusaram a oferta de compra, mas decidiram publicar o código-fonte gratuitamente, enquanto se preparavam para entrar na faculdade.
Antes da matrícula, no entanto, o pai de Zuckerberg ofereceu ao filho – e às suas três irmãs – a possibilidade de abrir uma franquia do McDonald´s em vez de ir para a faculdade.
Essa proposta também foi recusada, e Zuckerberg se matriculou na prestigiosa Universidade de Harvard para cursar Ciência da Computação e Psicologia.
Em seu segundo ano de estudo, ele criou mais um sistema que trouxe características que conhecemos hoje no Facebook, o CourseMatch, que utilizava inteligência coletiva para dar sugestões de matérias aos alunos de Harvard.
O sistema ajudava a escolher as aulas com base nas decisões de outros usuários, além de facilitar a criação de grupos de estudos.
Em outubro do mesmo ano, Zuckerberg desenvolveu o Facemash, uma tipo de precursor do Facebook. Recuperando-se de uma desilusão amorosa, ele criou uma brincadeira para alunos de Harvard escolherem seus colegas mais bonitos em “batalhas virtuais”.
Para montar o Facemash, ele acessou ilegalmente os sites dos alojamentos e capturou registros com nomes e fotos dos moradores. Em um final de semana de outubro de 2003, o site foi ao ar. Mas ao menos a coordenação da universidade não achou muita graça na brincadeira.
Com a viralização da página, o sistema recebeu, em quatro horas, 450 visitas que avaliaram 22.000 fotos, o suficiente para derrubar um dos switches da universidade, atrapalhando a conexão à internet. Na segunda-feira seguinte, o site foi retirado do ar.
Junto com o sucesso, vieram as primeiras queixas sobre privacidade. Diversos alunos reclamaram de que sua imagem foi utilizada por Zuckerberg sem sua permissão.
Mark reconheceu o erro e pediu desculpas, o que contribuiu para que Harvard não o expulsasse e retirasse as acusações de quebra de copyright, quebra de segurança e violação de intimidade.
A criação do Facebook
Naquela época, havia uma demanda entre os estudantes para que Harvard criasse um site que incluísse mais informações sobre os alunos e facilitasse a comunicação entre eles.
Neste ambiente, Zuckerberg decidiu se antecipar e desenvolver seu próprio site para unir os colegas, pois, segundo ele, “poderia fazer melhor do que eles, e conseguiria fazer em uma semana”.
Em janeiro de 2004, começou a escrever em seu alojamento as primeiras linhas do novo projeto para integrar os alunos de Harvard. A ideia foi dividida com seu colega, o brasileiro Eduardo Saverin, e cada um investiu US$ 1.000 no projeto.
Mas o intenso trabalho de programação de Zuckerberg faria com que a divisão da sociedade fosse de dois terços para ele e um terço para o brasileiro. Assim, no dia 4 de fevereiro do mesmo ano, foi ao ar Thefacebook.
Mark Zuckerberg foi a primeira pessoa a se inscrever no próprio site, mas, curiosamente, seu número de série é 4, atrás de três perfis falsos criados por ele mesmo para testar o sistema.
Com o site no ar, Zuckerberg passou a convidar os amigos, pedindo que eles se inscrevessem e convidassem outras pessoas. Nas primeiras 24 horas, o site já tinha mais de mil alunos de Harvard cadastrados e, no fim do primeiro mês, metade dos estudantes da universidade já tinham seu perfil no Thefacebook.
O site não era nada parecido com a gigante rede social que pode ser acessada hoje. Não havia o mural, nem o feed de notícias. Tratava-se de um ambiente online para o usuário inserir informações pessoais e conectar-se com amigos de Harvard – apenas Harvard, já que, para fazer o cadastro, era necessário ter um e-mail interno da universidade.
Apesar da interface relativamente simples, a adesão foi massiva. Com o sucesso, Zuckerberg chegou a ser entrevistado para o jornal da universidade. Afirmou que não havia criado o site para gerar receita e que “não venderia endereço de e-mail de ninguém”, pois essa busca por dinheiro deixaria tudo “mais sério e menos divertido”.
O sucesso inicial levou Zuckerberg e Saverin a buscar ajuda. Pouco depois de colocar o site no ar, eles chamaram os colegas de faculdade Dustin Moskovitz, Andrew McCollum e Chris Hughes para fazer parte do projeto. É por isso que, hoje, os cinco são considerados fundadores do Facebook.
Dois meses após a criação do site, os fundadores decidiram ir além de Harvard e abriram as inscrições para outras universidades da chamada Ivy League, que incluem as melhores escolas dos Estados Unidos.
Com o crescimento explosivo do Facebook, e contra a vontade dos pais, Zuckerberg decidiu interromper os estudos e mudar-se para Palo Alto, na Califórnia, junto com seus sócios.
Lá, alugaram uma casa para servir de escritório. Uma das primeiras ações oficiais dos jovens empresários foi comprar o domínio facebook.com por US$ 200.000 e tirar o “the” do nome oficial da empresa.
No processo de abertura da rede para mais membros, o Facebook chegou a universidades em diversos países e abriu acesso para jovens do ensino médio dos EUA e para funcionários de grandes empresas como Apple e Microsoft.
Até que, em setembro de 2006, dois anos e meio após a fundação, o Facebook foi finalmente aberto para todas as pessoas com e-mail válido, acima dos 13 anos.
O crescimento no número de usuários foi explosivo. Ao final de 2008, eram mais de 100 milhões de contas. Em julho de 2010, esse número havia batido 500 milhões. O primeiro bilhão veio em setembro de 2012, e o segundo bilhão em julho de 2017.
O tamanho do império
Para financiar o crescimento, o Facebook recebeu US$ 500.000 em uma rodada de investimento anjo liderada por Peter Thiel em meados de 2004, nos primeiros meses da rede social. Cofundador do PayPal, o alemão ficou com 10,2% da companhia e assumiu uma cadeira no conselho.
A rodada Series A, de US$ 12,7 milhões, foi liderada pela Accel em abril de 2005. Com a capitalização, a rede social foi avaliada em US$ 98 milhões. No ano seguinte, a Greylock liderou a Series B com US$ 27,5 milhões, ao atribuir um valor de US$ 500 milhões ao Facebook.
O sucesso também atraiu as gigantes da tecnologia. Zuckerberg negou diversas tentativas de venda para empresas como Yahoo, Microsoft e Google até que, em outubro de 2007, a Microsoft adquiriu 1,6% do Facebook por US$ 240 milhões, o que colocava a rede social com um valor de mercado de US$ 15 bilhões.
O próximo passo na capitalização veio em fevereiro de 2012, com o IPO (sigla em inglês de oferta inicial de ações) na Nasdaq. Ao preço de US$ 38 por ação, o objetivo inicial de levantar cerca de US$ 5 bilhões.
Foi a terceira maior oferta inicial realizada em bolsa de valores até aquela data, com os lotes extras levando o volume de captação a US$ 16 bilhões.
No começo de 2020, o Facebook operava acima dos US$ 220, um retorno total de 480% sobre o valor do IPO. Zuckerberg segue como o principal acionista com cerca de 20% do capital e mais de 50% do direito de voto, o que dá a ele total controle sobre os caminhos da companhia.
Zuckerberg vai às compras
Após as rodadas de financiamento e com a rede social passando a dar lucro pela primeira vez em setembro de 2009, o Facebook começou a olhar para o mercado, em busca de empresas para adquirir e adicionar valor ao seu negócio.
A primeira compra ocorreu em 2009, com a incorporação do agregador de notícias e redes sociais FriendFeed por US$ 47,5 milhões, sendo US$ 15 milhões em dinheiro e US$ 32,5 milhões em ações da rede social. O projeto, no entanto, foi encerrado em 2015.
Em seguida, o Facebook comprou uma série empresas para se fortalecer com soluções prontas, em vez de desenvolver tudo internamente. Em 2010, a rede social agregou a Octazen Solution, especialista em importação de contatos, e a Divvyshot, para compartilhamento de imagens.
O primeiro nome de peso apareceu em 2012, com a compra do Instagram por US$ 1 bilhão. O momento foi estratégico para as duas empresas: o Instagram acabava de abrir seu feed para aparelhos Android, enquanto o Facebook completava poucas semanas de seu IPO.
O ano seguinte foi de aquisições de menor porte, com a incorporação do time de desenvolvimento da Storylane, por valor não revelado, e a empresa de análises Onavo, por US$ 120 milhões.
Essas compras abriram caminho para a mais pesada aquisição da história do Facebook. Em fevereiro de 2014, a rede social desembolsou US$ 19 bilhões em dinheiro e ações para comprar o WhatsApp, concorrente de seu produto Messenger. Na época, o aplicativo tinha quase 600 milhões de usuários e superou o marco de 1 bilhão de usuários dois anos após a compra.
Em uma aposta na realidade virtual, comprou a startup Oculus VR, que desenvolve óculos, por US$ 2 bilhões em 2014. O projeto, que por enquanto rendeu poucos frutos ao Facebook, segue sendo desenvolvido com a crença de que a tecnologia será essencial no futuro.
Na última grande polêmica, o Facebook anunciou em 2019 a criação de uma criptomoeda, a Libra, que deverá entrar em operação em 2020. A ideia é criar uma moeda lastreada em dólares, euros, ienes, libras e dólares de Singapura para gerir os pagamentos na rede social.
O projeto sofreu ataques pesados de organizações, banco centrais e governos de diversos países. A Europa criticou fortemente o controle de meios de pagamento pelo Facebook, enquanto a França avisou que a Libra seria proibida no país e a Alemanha ameaçou classificar a empresa como um banco informal. Os reguladores americanos pediram para que o Facebook interrompesse o projeto.
A crítica pública e as disputas internas fizeram com que gigantes como PayPal, eBay, Visa, Mastercard e Mercado Pago abandonassem o projeto em outubro de 2019.
Cambridge Analytics e disputas na Justiça
A ascensão meteórica do Facebook tem um capítulo importante de disputas legais e éticas, que acabaram afetando a imagem de Mark Zuckerberg e da própria rede social.
No caso mais emblemático, Zuckerberg e Facebook sofreram um grande abalo em suas imagens ao reagir com pouca transparência no caso do roubo de dados pela Cambridge Analytics. Em 2018, um ex-funcionário da Cambridge contou que a empresa havia capturado irregularmente dados de milhões de americanos para uso em campanhas políticas.
O caso era de conhecimento do Facebook desde, ao menos, 2015, mas a rede social se recusou a comentar publicamente o roubo de dados e alertar os usuários afetados. O escândalo fez desaparecer mais de US$ 100 bilhões em valor de mercado do Facebook e fortaleceu a posição daqueles que defendem uma regulação governamental das redes sociais.
Mark Zuckerberg pediu desculpas após o caso vir a público, mas evitou rotular o escândalo como roubo de dados, ao defender que as pessoas aceitaram compartilhar suas informações com a Cambridge Analytics.
Em depoimento ao Congresso americano em 2018, a imagem do empresário ficou ainda mais abalada com sua aparição com rosto pálido e atitude evasiva ao evitar responder diretamente diversas perguntas de deputados e senadores.
O Facebook recebeu uma multa de cerca de US$ 5 bilhões do governo dos EUA e ainda deverá ser punido em diversos outros países afetados, como o Reino Unido. Na esteira do escândalo, diversos grupos passaram a defender mais ativamente a regulação e possível divisão da empresa, considerada monopolista, além de movimentos de boicote ao Facebook e muitos memes com o rosto pálido de Zuckerberg.
Entre as controvérsias já resolvidas, está a disputa entre os fundadores Zuckerberg e o brasileiro Eduardo Saverin. No primeiro ano da rede social, Zuckerberg decidiu reduzir a participação do seu sócio, que não estava trabalhando diariamente na companhia.
Em uma jogada societária, criou uma empresa que incorporou o Facebook e, na mudança, distribuiu um valor menor de ações para Saverin. A resposta? Saverin bloqueou todas as contas bancárias da empresa.
O brasileiro entrou na Justiça contra Zuckerberg e o Facebook e conseguiu um acordo extrajudicial, cujos termos não foram revelados. Parte da disputa foi contada no filme A Rede Social, de 2010.
Zuckerberg também enfrentou a acusação de que mentiu para colegas de Harvard ao fingir participar de um projeto de uma rede social da faculdade – chamada de HarvardConnection e rebatizada, posteriormente, de ConnectU –, enquanto ganhava tempo desenvolvendo o Facebook.
Em acordo judicial em que foi acusado de roubar a ideia de rede social e intencionalmente atrasar o projeto concorrente, o Facebook pagou US$ 20 milhões em dinheiro e 1,2 milhão em ações.
FONTE: Infomoney
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